31 de outubro de 2010

Para além de bebidas, mulheres e farras: em que consiste a vida de um homem virtuoso?

Há algum tempo que venho tentando escrever esse post. Na maioria das vezes, até começo bem. Mas depois de algumas palavras, a ideias começam a fugir, justamente porque eu não consigo me conectar muito bem com o sentido dele. Agora por exemplo: enquanto escrevo, uma ressaca dos infernos me assola. Fruto de duas noites mal dormidas, muita bebida e muita farra. Tudo que um homem que almeja alinhar sua vida não pode ter. Desse modo, como posso tentar explicar para alguém o sentido de uma vida virtuosa, se a minha anda uma confusão só? Como colocar na cabeça das pessoas que se aprendermos a cortar essas pequenas distrações, nossa qualidade de vida aumenta e, consequentemente, nossas relações se tornam mais autênticas, se eu mesmo não resisto ao som de uma cerveja gelada sendo colocada no copo? Enfim, keep walking...

Nós homens nos reunimos ao redor de bebidas, em festas, para pegar mulheres, para ir à praia, para assistir ao futebol ou simplesmente para jogar conversa fora. Até aí nada demais. Contudo, o que nos acontece quando limitamos nosso horizonte a essas simples ações? Que sentido estamos dando para nossa vida se bebemos demais, se nossa prioridade é pegar cada mulher gostosa que nos é apresentada ou então se nos impomos a todo fim de semana irmos a uma festa? Se você respondeu nenhum sentido ou quase nenhum, está, assim como eu, tentando enxergar além dessa nuvem de distrações que deixa nossa visão turva. E isso já é um começo interessante.

Todos que me conhecem bem sabem que sou um beberrão incontrolável, tenho facilidade em lidar com as flutuações femininas ( há sempre algumas exceções, claro) e que sempre que posso, estou batendo lata em alguma festa. Porém, o que pouca gente sabe é da angústia que isso me traz. Conversando com um amigo um dia desses, tocamos no assunto de que só temos uma vida. E ela é curta. E passa muito rápido. E não podemos desperdiçá-la com bobagem ou algo que faça pouco sentido. Esse post é uma tapa que estou dando no meu próprio rosto. Eu sou mestre em perder tempo e em desperdiçar a vida com bobagens. Bebo muito. Fumo demais. Durmo pra caralho. Não vivo com paixão e na maioria das vezes aperto o botão do piloto automático da minha vida e fico nesse estado por bastante tempo. Uma vez ou outra tenho lapsos de consciência e, por pouquíssimo tempo, consigo fincar os pés no momento presente. E são nesses raros momentos de lucidez que eu começo a questionar o que estamos fazendo de nossas próprias vidas. Quando estivermos velhinhos, qual sentimento teremos a respeito de tudo que vivemos? Foi uma vida virtuosa ou supérflua? Vivemos com dignidade ou passamos tempo demais xeretando o orkut dos outros? E aí? Iremos morrer felizes por termos vivido de modo pleno ou iremos nos despedir desse mundo amargurado por ter se dado conta tarde demais de quão preciosos momentos deixamos passar?

Sem medo de viver

O título desse post é só uma metáfora. Quando digo para além de bebidas, mulheres e farras, eu procuro englobar tudo aquilo que te faz perder tempo e andar distraído por esse mundo. Há gente que perde tempo com computador. Outras com televisão. Outras morrendo de véspera igual a peru. Enfim, você é responsável pela sua vida e sabe muito bem o que te faz perder minutos preciosos. Mesmo eu não servindo de exemplo para muita gente, acredito que para além de bebidas, mulheres e farras, há um horizonte muito amplo que só é revelado a partir do momento em que eu começo a viver com autenticidade. Homens virtuosos vivem assim. Eles têm seus medos, assim como eu ou você. A diferença é que eles não deixam que esse medo os paralisem e também não perdem tempo com coisas que não valem a vida deles. Homens virtuosos vivem como se não existisse o amanhã. O que importa é só o momento presente. E só. O passado já ficou para trás. O terreno do amanhã é incerto. Só resta o presente. Eles fazem hoje o que tem que ser feito hoje. Eles são precisos e cortantes. Seu olhar é em 90 graus, wide open. Seu riso é leve e espontâneo e você geralmente os identifica pela capacidade que eles têm de dar leveza à vida. E o modo de viver de um homem virtuoso só consiste numa coisa: viver e aceitar todos os riscos inerentes a isso. Qualquer coisa além disso, é bônus.

Para além de bebidas, mulheres e farras há uma necessidade de acordarmos, cortamos as distrações e aprendermos a ser livres desses condicionamentos que nos tiram o brilho da vida. Para além de tudo isso, precisamos nos posicionar no mundo e reconhecer qual é a nossa missão. É inadmissível passarmos aqui sem termos construído nada. É completamente repugnante a ideia de que por conta de nossos medos e nossa insegurança, deixamos de vivenciar coisas maravilhosas que uma pessoa, que vive em cadeira de rodas, por exemplo, daria tudo para viver. Escrever um livro, fazer rapel, saltar de paraquedas, acampar, surpreender o companheiro, ver um por-do-sol em silêncio com a namorada. Não faltam alternativas nesse mundo. Cabe a você escolher o que mais se encaixa no seu perfil. Ou você quer esperar um diagnóstico de câncer para poder viver com a intensidade que lhe é devida? Para além de mulheres e bebidas há um vasto mundo a ser descoberto. Um extenso caminho a ser percorrido. Comece enquanto é cedo. O tempo que passou já foi perdido e não volta mais. Comece a dar sentido a sua vida a partir de agora. Há tempo ainda.


P.S.: Para quem quiser refletir um pouco mais sobre o sentido que está dando a sua vida, recomendo assistir aos filmes Sem medo de viver (Fearless) e Na natureza selvagem (Into the wild), ambos preciosidades que falam tudo sem dizer muito.


14 de outubro de 2010

Do nosso observador intacto ou da minha vontade de me tornar um Paulo Coelho

Esta é uma continuação do post "De nossas máscaras e da impermanência de nossas identidades", no qual foi tratado de modo breve a questão do observador intacto. Esse ser que está o tempo todo nos acompanhando, nos vendo sofrer, sorrir, se alegrar, chorar, meter, gozar, dar tapa na bunda, mas que ao mesmo tempo está livre de tudo isso. Chamamos esse ser de observador intacto justamente porque ele sempre está livre de nossas flutuações, mesmo que a princípio não percebamos isso. Ele está além de nós e para achá-lo precisamos procurar alguém em nós que não seja nós mesmos. Confuso isso, não? ;-)

Quando estamos imersos em sofrimento, frustração, raiva, desespero ou algo parecido, solidificamos tanto aquilo que achamos que nunca vai passar. Assumimos a identidade da pessoa sofrida e esquecemos a lei da impermanência. Depois de algum tempo, aquela mesma pessoa que sofria não só consegue rir de tudo aquilo como também ainda faz piada. O que aconteceu? A identidade sofrida morreu. O ser que solidificava as coisas foi embora. Contudo, há um observador profundo que vai muito além de nossas oscilações de humor e que nunca vai embora nem morre. Ele é o responsável por tua liberdade no momento em que você se encontra no olho do turbilhão. E nossa dificuldade em perceber isso se dá justamente porque no momento em que saímos de um, já nos preparamos para entrar em outro. De fato, quase nunca paramos para conversar com esse ser. Sempre que temos oportunidade, evitamos o encontro com ele. Justamente porque ele jogará em nossa cara nossas limitações e irá fazer piada de nossas fraquezas. Mostrará que nossa capacidade de resolver problemas é limitada pelo simples motivo de que esquecemos a leveza das coisas. Não é questão de se aventurar numa vida irresponsável. É dar às coisas seu devido peso. E só. Um fim de namoro parece um fardo duro de se carregar porque não temos naquele momento a liberdade de entender que ciclos começam e acabam. Nosso observador se encarrega de fazer isso. Ele sacaneia conosco. Ele não se identifica com nada. Apenas surfa no que o momento oferece. Se é oferecido uma marola, ele faz de tudo para aproveitá-la. Se é oferecido um Tsunami, ele tenta não se afogar. Nosso observador consegue tirar proveito de qualquer tipo de situação que lhe é oferecido. Ele não rótula as coisas como boas ou ruins. Apenas aceita o que o momento traz. E o que é melhor: ele vê tudo como experiência, seja sofrimento, seja alegria. Diferentemente de nós que nos abrimos plenamente para a felicidade e nos fechamos completamente para a dor. Nosso observador intacto sabe que a vida de um homem não é feita só de alegria, nem só de acertos, nem só de virtudes. Nosso observador entende que momentos difíceis, erros e defeitos são necessários e, por isso, aceita tudo como é, sem rotular nada, sem se identificar com nada, sem solidificar nada. É dessa atitude que nasce a nossa liberdade. Pena que nem sempre temos tempo para pensar nisso. Pulamos de uma situação para outra num piscar de olhos. Saímos de um casamento para outro com uma facilidade absurda. Escondemos nossos problemas com um sorriso perdedor. Afogamos nossas desculpas no mais gelado copo de cerveja. Tudo isso porque talvez tenhamos medo de saber quem somos na essência. Fugimos do maior encontro que um homem pode ter: você e você.

Basicamente, seria essa a função do observador intacto. Ir além das flutuações e manter a lucidez que te faz encontrar o rumo das coisas novamente. No entanto, penso que essa abordagem é bastante genérica e não quero de modo algum limitá-la a apenas isso. Cabe a você encontrar esse observador e se conectar do modo que melhor lhe convir quanto a isso. E uma prática bastante simples para desenvolver liberdade e ter uma conexão melhor com esse ser intacto é a auto-observação. Esse processo consiste em se manter consciente de si mesmo em qualquer tipo de situação. Um exemplo: um amigo te falou umas verdades e você ficou puto. Tente se lembrar nesse exato momento de você ficando puto. Das sensações, das emoções perturbadoras, dos insights. “Eu não sei se criticado sem querer me defender.” Ou então passa uma gostosa do seu lado e você fica molhadinho: “fiquei de pau duro com o decote dessa gostosa.” Enfim, tente colocar consciência em suas ações, lembrando-se o tempo todo de si mesmo. Desse modo, você acaba desenvolvendo tamanha liberdade de si mesmo e dos outros e das situações que quando vir novamente o turbilhão, irá sossegadamente empinar pipa ao lado do seu observador intacto. Sorrindo. Leve. Quase voando. Quase indo embora.