14 de março de 2011

Por causa de uma gostosa

- Qual o oposto de livre?

- Preso?

- É, deve ser. – Tomei mais um gole da minha cerveja. E continuei:

- Você tem alguma palavra preferida?

- Atmosfera. – Disse, depois de pensar um bocado.

- Sabe, eu tenho uma palavra preferida...

- E qualé?

- É “queda-livre”.

- Mas aí seriam duas palavras...

- Sim, eu sei, eu sei. É o que os professores de português chamam de palavras compostas.

- Mas por que essa palavra?

- Pô, não sei... Não sei se é porque eu só gosto da palavra e alguma coisa da sua etimologia, ou se algo no conteúdo me atrai.

- Que que tem?

- Que que tem, que, não pode haver queda-presa. Porque se for queda presa, vai deixar de ser queda.

- Sim...

- É por isso que eu gosto de queda-livre.

Então tomamos mais um gole de cerveja e pedimos prum garçom felá-da-puta, mal-humorado e com má-vontade em trazer a calabresa com fritas.

- Mas... – continuei. – Mas, será que é possível medir as palavras?

- Como assim, letra por letra?

- Não, digo... a palavra “tijolo”... com que eu posso medir essa palavra. Digo, com quantos centímetros esse meu tijolo será medido.

- Depende de que tipo de tijolo você tá falando.

- É... – tomei mais um gole. – Mas deve existir algo que meça... deve existir algo para medir as palavras.

- Deve? Por quê?

- Porque da mesma forma que existe um céu, existe um chão.

- An, sei sei...

- E qual é o tamanho idéia da sua atmosfera?

- Acho que bem grande...

- Viu, como você pode medir a sua atmosfera?

- Acho que temos diferentes tipos de medidas.

- Tudo bem, podemos até ter diferentes tipos de medidas, mas... os meus 2,2 centímetros literários, podem equivaler a talvez; 1,9 centímetros literários seus.

- Ok, mas que a minha atmosfera é grande, é.

- Minha queda... eu gostaria que ela fosse infinita.

- Por quê?

- Eu gosto da idéia de cair pra sempre, porque vai deixar de ser uma queda para ser um vôo.

- É, não deixa de ser um vôo. Se você estiver caindo, é só ficar de cabeça-pra-baixo, e vai estar subindo.

- Qual a maior palavra que pode existir?

- Maior palavra?

- Digo... se a gente pode medir as palavras, qual seria a maior palavra?

- Não sei... talvez “amor”?

- Naaaam, isso já tá manjado demais...

- Que tal, absoluto?

Finalmente chegaram as batatinhas e as fritas...

- Garçon, outra cerveja aí, na moral. – Pedi. – Mas veja... depende do tamanho do absoluto. - Voltei a conversa.

- Porra, absoluto, vai ser sempre absoluto, cacete.

- Ok, ok... Se deve existir uma maior palavra, deve existir uma menor, um átomo de palavra.

- É, deve existir.

- E como a gente alcança essa porra?

- Com um telescópio literário.

- Porra, que idéia do caralho!

- Que foi, que foi?

- A gente não precisa medir a palavra pra ver qual é a maior, basta saber qual é a substância Elemental da palavra, porra!

- Como?

- Simples... você disse atmosfera, e o que pode conter substancialmente na porra da tua atmosfera.

- Acho que... – Ele deu um gole. Todo o mundo que eu desconheço.

- Então, porra! A gente faz assim, a gente pega a palavra, sei lá, por exemplo: “cafona”, e depois tira as suas medidas, e compreende seu elemento básico... E uma vez desfragmentando tudo da palavra fica mais fácil em estendê-la ao infinito.

- Massa... como?

- Acho que... se perdendo na palavra. Deve existir uma palavra que uma vez dita, modifique totalmente o mundo, modifique totalmente o momento, e dessa palavra, seremos escravos, até que uma vez dita, ela consiga nos libertar.

Até que passou uma gostosona perto do bar:

Que tal criarmos teorias universais?

- Benza-te, Deus.

- É muita mulher pra uma pitoca só, olha!

- Ah, se eu fosse homem!

- E tu és o quê, porra?

- Sou menino!

- Ali, peito mandou lembrança, viu.

- Essa tem cara de quem pede um tapa!

- Bote fé, bote fé.

Após o silêncio da concentração melancólica e sexual, voltamos a realidade:

- Mas sobre o que estávamos falando mesmo?

- Sei lá...

E perdemos a maior descoberta literária da humanidade, por causa de uma mulher gostosa.

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