11 de maio de 2011

O dia em que me transformei em Henry Charles Bukowski (Parte III- Final)

(Continuando...)

Nos arrumamos e nos deslocamos para o centro da cidade, lugar no qual acontece toda a badalação. São vários bares, restaurantes, botecos, pessoas. Enfim, uma infinidade de coisas para fazer e possivelmente merdas para aprontar. Aquilo daria um material perfeito para se escrever um conto depois. Nessa época eu tentava ser escritor. Inclusive as pessoas me perguntavam se eu continuava escrevendo e eu saía pela tangente dando a desculpa de que estava com bloqueio criativo. Nunca vi tamanha homossexualidade. Para mim, todo escritor que se dizia com bloqueio criativo, deveria levar umas boas dedadas e ser proibido de escrever qualquer coisa pelos próximos vinte anos, que é pra deixar de frescura. Meu caso era uma exceção. Eu não estava com bloqueio porra nenhuma. Pelo contrário. Andava escrevendo tanto que nem eu mesmo suportava ler meus textos. E todos tinham um modus operandi que era absolutamente previsível e descartado pelos editores: um cara inconseqüente, que bebe como louco, fuma como uma caipora e é uma verdadeira máquina de trepar. Não havia nada de emocionante nem de diferente neles. Na verdade, meus textos eram uma projeção do que eu queria ser e não fui. Eu sonhava em ser um cara fodão, que só bebia uísque doze anos, fumava duas carteiras de Godang Garam por dia, comia aquelas mulheres estilo comercial de cerveja e tinha na garagem um pequeno V8 conversível. Como isso não era possível, eu levava a vida bebendo cerveja barata, fumando cigarros vagabundos e trepando com mulheres de beleza quase sempre questionável. E automaticamente isso era transferido para meus personagens.

Chegamos ao centro da cidade e a primeira coisa que eu fiz foi procurar um lugar que vendesse cigarros. A vida ficava bem mais chata se você não pudesse fazer uma fumaça de vez em quando. Comprei logo dois maços que era para garantir um enfisema pulmonar antes que acabasse a noite.

Quando voltei para junto do pessoal, a maioria já estava dispersa e inclusive vi que o Malkovich estava em outro bar, mandando o xaveco numa loira peituda. Nossa Senhora, aquela mulher era um verdadeiro banco de leite. Poucas vezes vi um peito tão exagerado como aquele. Há peitos em que você encosta a cabeça e dorme como se fosse um pequeno travesseiro. Há outros que parecem uma grande almofada. Os daquela mulher eram simplesmente duas bóias de piscina. Não consegui associar a outra coisa. O lado bom é que pelo menos afogada, ela jamais morreria. E de quebra, ainda salvaria meu amigo. Dei mais uma tragada e fui em busca de alguma coisa interessante.

Vi Sarah conversando com umas meninas pertinho do calçadão. Sarah era uma garota perfeita, mas, como toda mulher, tinha as suas frescuras. A que mais me irritava depois do fato de ela me censurar na bebida e de ficar me chamando de vagabundo era o lance de ela detestar cigarro. E eu adorava fumar. As brigas por isso eram quase constantes.

No entanto, hoje eu iria pegar leve com ela. Não iria fumar na frente de Sarah e iria fazer o máximo para não ficar embriagado de novo. Bem, eu não estava fazendo isso porque gostava dela ou porque queria agradá-la. Aliás, eu até gostava, só que, como há muito tempo eu não sentia o calor de um rabo e nem dava umas tapas numa bunda, era preciso ser no mínimo, gentil. Tudo pela perpetuação da espécie.

-Hello, baby! Eu disse.

-Oi, Chin. Não achei que você viria! Disse Sarah. - Essas aqui são minhas amigas, July e Mirela.

As duas até que davam um caldo. Por um segundo, me imaginei comendo as três de uma vez. Seria pouco pau pra muita xoxota.

-Ficar em casa é para os fracos. E inclusive, eu queria te ver. Faz tanto tempo desde o fim. Queria saber sobre seus estudos, seu trabalho, sua família, enfim, sobre você.

-Hum rum... Disse Sarah com ironia. Você sempre disse que meu curso era coisa pra desocupado, que meu trabalho era coisa pra puta e que minha família era completamente desajustada.

-As coisas mudam.

-Rápido demais, até.

-Sarah, disse uma das amigas, a gente vai dar uma volta. Nos falamos depois.

-Ok. Ela disse.

Levei Sarah para sentar num bar e começamos o papo cabeça:

-E então, Chin? Disse ela.

-E então o quê? Perguntei.

O garçom trouxe o cardápio.

-Como anda sua literatura? Li um conto seu num fanzine por aí. Só falava em bebida e trepada e xoxota e cu. Você acha mesmo que as pessoas estão interessadas nisso? Você acha que essa é literatura moderna? Nunca vi um escritor falar tanto desses temas como você. Até parece que o mundo é feito apenas de rabos e peitos e vaginas e a sua obrigação é enfiar seu pênis em todos eles.

-Escuta, podemos adiar isso? Perguntei.

-O que há, Chin? Não está mais escrevendo?

-Sim, estou. Na verdade, de uns dias para cá estou até mais lírico.

-É mesmo?

-Claro. Você não deve ter lido meu ensaio sobre o amor.

-Aquele no qual você diz que o amor é igual a uma puta?

-Faz todo sentido. O amor vem, te faz um carinho, te dá uma bimbada, pega o que tu tens de valor e vai embora.

-Às vezes me pergunto por que me apaixonei por você.

O garçom voltou mais uma vez e eu pedi uísque. Sarah pediu água sem gás.

-Porque no fundo você sabe que na pele desse cara sujo, há um bom sujeito.

-Até hoje procuro o bom sujeito.

Chegaram nossas bebidas. Não consegui bem entender o que aconteceu, mas, de uma hora pra outra, ali naquele pouco tempo conversando com Sarah, eu refletia sobre tudo que eu havia feito com as pessoas, inclusive com ela. Eu não conseguia nem me alegrar e nem rir com isso. Era como se uma espécie de melancolia tivesse me assaltado. Tratei de me defender bebendo o uísque num só gole.

-Você vai ficar a vida toda assim, Chin? Bebendo, dormindo e vendo a vida passar desse jeito? Ela perguntou

-Você tem uma sugestão melhor?

-Você tem um grande talento, mas desperdiça com bobagens. Você é um cara cativante quando quer ser. Creio que a maioria das merdas que você faz, não é por mal. Entretanto, talvez seja a hora de crescer e acabar com essa síndrome de Peter Pan, Chin.

Senti um peso na voz dela.

-Você precisa levar mais a sério suas atividades. Falar de xoxota e cu não vai te levar muito longe. Ponderou Sarah.

Voltei a refletir. Tudo o que lea falava, fazia sentido. Pensei mais um pouco e finalmente levantei e disse:

-Sarah, vamos embora. Vamos para casa dar uma foda.

-É assim que você resolve seus problemas? Indo pra casa e dando uma foda?

É. Hoje quero dar uma foda e amanhã penso nisso.

-Tudo bem.

Nos despedimos do pessoal e fomos para casa andando. Não ficava muito longe dali. Cerca de dez ou quinze minutos de caminhada.

Chegamos e fomos direto para o quarto. Estava tudo escuro e eu continuava pensativo. Será mesmo que existe uma espécie de carma, onde as coisas que enviamos para o universo, voltam novamente para nós?

Sarah tirou a roupa. Ela continuava linda. O tempo passa, mas certas coisas nunca mudam. Aquela mulher era realmente incrível. De todas as mulheres com as quais eu já me envolvi, eu nutria um carinho especial por ela. Não pelo fato de ela ser gostosa, porém, pela capacidade que ela tinha de me atingir com palavras. E poucas pessoas conseguiam isso.

-O que há, Chin? Ela perguntou.

-É tudo tão estranho. A vida, o universo e tudo mais.

-Tira a roupa e vem me comer.

Foi o que fiz. Contudo, as coisas que eu havia feito hoje e em outros dias não saíam de minha cabeça. A minha vida passando, a minha falta de responsabilidade em relação a escrever, o meu modo de tratar as pessoas e de levar a vida... Em certo momento, achei que não conseguiria colocar pra dentro. Mas Sarah estava ali, implorando por isso. E dessa vez eu não podia decepcioná-la. Era bom estar com ela. Era bom estar com alguém que não iria te julgar. Montei nela e gratinei-a bem. Dei algumas estocadas e logo resolvi descer e meter a língua na xoxota. Sarah se contorcia. Era o mínimo que eu podia fazer por ela. Montei de novo e dessa vez estoquei com raiva. De repente, ouvi uma voz:

-Chinaski, seu filho da puta?

Era o tio de Malkovich, completamente bêbado. Fui até a porta.

-Fala velho! Não vê que estou ocupado?

-hahaha. É isso que você chama de pau? Até meu bisneto de cinco anos tem um pau maior que isso.

-Fala logo.

-Vamos tomar uma cerveja? Apesar de te achar um imundo, no fundo, acho você um cara sincero que não tenta ser o que não é e gosto disso em você.

-Obrigado, velho Fica para a próxima. Disse isso e fechei a porta.

-O que ele queria? Perguntou Sarah.

-Nada demais, só celebrar a amizade.

Sarah me abraçou. Nesse momento senti o mundo parar e eu não queria estar em outro lugar senão ali e nem com outra pessoa senão ela. Se for isso que chamam de amor, eu já poderia morrer, pois nunca senti nada tão poderoso. Nos abraçamos ainda mais forte e a sensação que eu tinha era de que meu sangue iria romper minhas veias. Chinaski também era capaz de amar. E mais ainda de escrever. Eu estava me sentindo vivo de novo.

O velho Bukowski devia estar bastante orgulhoso disso.

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