17 de julho de 2015

Feliz aniversário (refeito)

O dia começou difícil. Acordei com os pentelhos na goma  sem o menor motivo. Virei para o criado mudo e peguei um cigarro. Acendi. Traguei. Olhei novamente para o criado mudo e vi que ainda restava meia garrafa de Cavalo Branco. Peguei e bebi na garrafa mesmo. Aprendi que é assim que um macho de verdade lida com um dia ruim. Bebendo uísque quente e na garrafa, nessa porra.

Tomei alguns goles e lembrei que tinha que levantar para trabalhar. Levantei e vi tudo girando. Puta que pariu. Fui até o banheiro, vomitei e caguei uísque, me limpei, tomei banho e ri daquela merda. Literalmente. Fedia, mas o dia estava começando a ficar engraçado. Ri e peidei por causa disso.
Era 01 de Abril. Lembrei que era meu aniversário. Aliás, não tem como esquecer essa data. Cai justamente no dia da mentira. Já podia imaginar meus colegas de trabalho com aquelas brincadeiras babacas do tipo: “01 de abril!” Enfim, fiquei puto novamente e fui atrás do meu uísque.

Eu estava me embebedando mais do que era permitido para trabalhar. Não havia colocado nada sólido no estômago ainda, mas a garrafa de uísque estava quase no fim. Procurei alguma coisa para comer. Minha namorada, que havia dormido comigo noite passada, não deixou nada pronto e foi embora sem avisar. Pior, esqueceu-se do meu aniversário. Já não se fazem mais namoradas como antigamente, pensei. Cocei a glande e fui procurar algo rápido para comer. Já estava quase atrasado. Mais uma vez fiquei puto. É incrível como tenho ficado bastante puto ultimamente.

Um homem que mora sozinho tem sempre um estoque de miojo em seu armário. De sabores variados: bacon, costela, camarão, carne, galinha, peixe, verduras e legumes, sopa de miojo, churrasco de miojo, miojo ao molho branco, miojo ao molho barbecue, miojo ao molho madeira, enfim, uma variedade de sabores especialmente preparada para gente moderna como eu, que sabe que está na moda temperar o corpo com sódio. Era só ferver a água, esperar alguns minutos, afogar a massa do macarrão, escorrer e jogar o tempero por cima.  Viva a modernidade.

Comi quatro miojos lembrança de costela e fui ao quarto me vestir para trabalhar. Meu trabalho era um saco. Absolutamente burocrático. Eu trabalhava no departamento de carimbação oficial do IML. O presunto chegava lá, o pessoal fazia a limpeza e os outros procedimentos. No fim de tudo, eu olhava nos olhos do morto e dava o aval se ele estava liberado ou não. Se estivesse liberado, dava uma carimbada autorizando o envio do corpo à família. Porém, antes de o corpo sair, alguém da família deveria se dirigir a minha sala e assinar um documento que deveria ser autenticado e protocolado em três vias, ficando uma no IML, outra com a família e a outra enviada para o Governo do Estado de Pernambuco com o intuito de fazer o censo de quantos presuntos chegavam a nós por mês. Eu não entendia muito bem o porquê disso. Apenas fazia o que mandavam.

Fui trabalhar. Ao chegar, avisto de longe meus colegas com os seus sorrisos amarelos estampados naqueles rostos sofridos. Cumprimentei cordialmente cada um deles:

-Bom dia, senhores. Quer dizer, bom dia um caralho! Como é que se tem um bom dia se nesse emprego você está sempre olhando a cara da morte, para ver se ela ainda está viva?

-Sabe que dia é hoje, Alfred? Esse era meu nome.

-01 de abril. Dia da mentira. O que tem demais nisso? – Perguntei.

- Não está esquecendo de nada?

- huuummm... – Gemi.

-Hoje é sexta feira, seu bosta. E é a primeira sexta feira do mês. Sabe o que isso significa?

-Caralho, esqueci! Respondi pasmo.

Toda primeira sexta feira do mês, o chefe do IML organizava um happy hour totalmente de graça para nós. Chopp, cerveja, uísque, vinho, mulheres, uma variedade de peitos e vaginas para todos os gostos. Tudo free. Ele dizia que como nosso trabalho era bastante chato e estressante, nada melhor do que começar o mês chutando o pau da barraca. Eis um homem de sabedoria plena. Deus o abençoe.

-Mas o chefe falou que esse mês não vai rolar o happy hour. Disse um colega de trabalho.

-Por quê? Perguntei incrédulo, praticamente chorando.

-Ah, cara... no último que rolou ele acha que você extravasou demais. Até hoje ele não engole a estória de que você comeu no banheiro da boate a Ana Bisturi.

Ana Bisturi era do setor de autopsia. Ela tinha esse nome porque, como nenhuma outra pessoa naquele IML, tinha uma facilidade impressionante de cortar as coisas. Tanto as mortas, como as vivas, se assim fosse necessário e de modo especial, as coisas que viviam penduradas.

-Ah cara, isso já faz parte do passado. Eu e a Ana Bisturi somos grandes amigos. Eu disse.
-Amigos demais, para o gosto do chefe. Você sabe, Alfred. O chefe é louco por ela. É bom você ficar longe e não se meter em mais encrencas. Senão a próxima autopsia que a Ana vai fazer é do seu bilau. Que por sinal, deve ser uma visão do inferno. Faltarei nesse dia.

- HAHAHA. –Seus arrombados. Eu preciso trabalhar. Até mais.

-Até.

Fiquei triste por não rolar o happy hour daquele mês. Mas fiquei mais triste ainda porque nenhum dos meus colegas de trabalho lembrou que era meu aniversário. Nem minha namorada, nem meus amigos, nem meus pais, ninguém, absolutamente ninguém havia lembrado que era meu aniversário. Filhos da puta. Só estão preocupados com seus próprios cus, refleti.

Aproveitei que não tinha muito movimento aquele dia e adiantei todo o trabalho. Passei a manhã carimbado como um louco. Meu Deus, de onde vinha tanta gente morta? Se esse ritmo não diminuir, daqui a uns dias sou eu que morro de tanto trabalho.

Perto da hora do almoço, minha secretária, que tinha umas carnes onde toda mulher deveria ter, bateu em minha porta:

-Sr Alfred, posso entrar?

-Claro, Rosinha, fique à vontade, respondi, tendo um leve princípio de ereção.

-Sr, Alfred, eu sei que apesar de todo mundo só lembrar que hoje é o dia da mentira, é também seu aniversário.

- Oh, Rosinha! Você lembrou. Finalmente alguém lembrou que eu existo. Estou tão feliz. – Disse isso tendo já uma ereção completa.

-O que o senhor acha de irmos almoçar para comemorar?

-Claro, claro! Onde vamos? –Torci para que ela respondesse no motel.

-Não sei, no caminho a gente escolhe.

Peguei minhas coisas e a acompanhei.

Saímos e eu pensei que Rosinha nos levaria a um restaurante de nome sugestivo, onde as pessoas daquele IML comiam, chamado Coma Tudo. Digo sugestivo porque os atendentes são gays, o gerente é gay e muitos clientes, fora eu e Rosinha, também são gays. Os garçons te servem tentando fazer aquele olhar sedutor, falando algo do tipo: “- o que o senhor vai querer hoje? Franguinho a frufru com molho especial? É o prato do dia. E a racha, vai ficar só na alface?” Enfim, sempre desconfio desse nome porque se vacilar, acaba comendo o que não está no cardápio. Bastante constrangedor.

Porém, eu me enganei feio. Rosinha nos levou a um restaurante reservado e pediu mesa só para dois. O restaurante era uma coisa muito sofisticada e a comida parecia ser boa. De entrada, veio um cara todo empacotado perguntando se iríamos beber algo. Rosinha pediu um casillero Del diablo. Para comer, pedimos batata rostie e bradwurst com mostarda escura. Eu nunca nem ouvi falar naquele prato. Se fosse ruim, estaria tudo perdido.

O vinho chegou e tratamos logo de abastecer nossos copos. Meu Deus, como era delicioso aquele vinho. Quando se é acostumado a beber vinho carreteiro e se coloca outra coisa melhor no lugar, os dentes do cidadão parecem que vão cair, tamanha é a emoção. Bebi aquele manjar de uva cabernert como um camelo bebe água no deserto. Rosinha era fraca para bebida, no fim da primeira taça, ela já ria a toa. Tratei de dar conta do resto da garrafa.

A comida de nome estranho chegou e estava bem apetitosa. Comemos como se não houvesse amanhã. Éramos dois cavalos que não pastavam há dias. No fim, eu já não agüentava mais. Deixei um pouco no meu prato ainda. Rosinha, apesar de magra, raspou o dela. Fiquei imaginado para onde iria aquela comida toda, já que rosinha lembrava muito um chassi de grilo. Pagamos a conta e fomos embora.

No caminho de volta para o trabalho, Rosinha comentou como o dia estava bonito e disse ainda que nós tínhamos bastante tempo para tomarmos um vinho que estava na casa dela antes de voltarmos ao trabalho. Achei a ideia excelente e involuntariamente, fiquei de pau bastante duro. A combinação mulher gostosa, mais vinho, mais só nós dois em seu apartamento me deixava eufórico. Rosinha era uma mulher direita e jamais se insinuou para mim. Contudo, sempre há uma primeira vez e, sinceramente, além de eu ser bem irresistível com meu jeito rústico, achava que ela estava precisando de uma boa dose de pica. Podia ouvir seus gemidos. Essa safada já deve estar toda molhadinha.

Chegamos ao seu apartamento. Estava um calor dos infernos. Rosinha tirou seu paletó e me disse que iria ao quarto tirar outras coisas. Nem é preciso dizer que quando ela falou isso, tive mais uma ereção.
- Fique à vontade. Ela disse. –Volto já.

-Ok. Eu disse.

Esperei ansiosamente no sofá por ela. Fiquei imaginando que ela estaria tomando banho e voltaria com uma lingerie preta matadora. Pensava em seus gemidos e em qual posição eu começaria a comê-la. Meu pau latejava de ansiedade. Passados alguns minutos, Rosinha me aparece com um bolo enorme, seguida por minha namorada, meus pais, meus amigos de trabalho, meu chefe e Ana Bisturi. Todos cantando “parabéns, pra você...”


Enquanto isso eu continuava no sofá... nu... de pau duro.

Um comentário:

Anne Beatriz disse...

Pois bem, era tudo que eu precisava ler para uma sexta de trabalho intensa que só acaba às 22h, cai na gargalhada e todos me olham me achando louca.

Continua o mesmo.

beijos